sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

OS MALES DA ESCOLA: TENTATIVA DE VISÃO GLOBAL

A cada dia surgem novos debates sobre os males que a escola sofre e sobre os que ela produz; também se fala muito sobre os resultados que ela deixa de alcançar. É que, como em outros campos do fazer humano – na política, por exemplo – basta a atenção de alguém, cuidadosa ou não, para descobrir, a toda hora, novos sofrimentos causados por processos mal-intencionados ou, mais frequentemente, erradamente encaminhados.

Não posso criticar os educadores, ao conjunto dos quais também pertenço, porque as causas principais de tantas mazelas não são apenas culpa deles; mas, se é verdade que se devem julgar as árvores pelos seus frutos, a situação da escola brasileira aconselha, no mínimo, que ela seja fechada para reforma.

Jornais, revistas, televisões e rádios divulgam, dia após dia, notícias que escandalizam os que ainda não tinham se dado conta das diversas desgraças. Agora entra em cena a discussão sobre os pais que compram trabalhos escolares para seus filhos escaparem da reprovação; antes, foram as agressões de alunos a professores; daqui a pouco descobrirão os sofrimentos que professores têm que infligir a seus alunos – quer dizer, interessar-se-ão por isto. Claro que são apenas exemplos e que há coisas de igual ou maior gravidade: 16 milhões de analfabetos entre as pessoas com mais de quinze anos, reprovações, evasão enorme e muitas outras coisas. O que não se discute é a relação entre esses problemas e a incoerência entre o quer se pensa ou se quer e os processos escolares instituídos. Queremos ir a Paris e, para isto, só temos um velho ônibus que nos leva sempre para Xanspara do Norte.

As causas de tais frutos (criemos a palavra “desfrutos”!) podem já ser enumeradas com base científica e não são principalmente tecnológicas, materiais ou administrativas; vão desde as mais amplas, derivadas do fato de que as instituições de uma sociedade constroem-se como reflexo desta mesma sociedade, até as que são consequência da incoerência entre a fala e o processo escolar, incluindo conteúdo, metodologias, estruturas escolares...

Veio-me à mente uma metáfora, um pouco esdrúxula, mas ilustrativa que ouvi ou li há muito tempo. Uma população ribeirinha começou a perceber que várias vezes por mês passavam, rio abaixo, levadas pelas águas, algumas crianças, em geral recém-nascidas, às vezes mortas, outras vezes ainda vivas. Logo organizaram um grupo para salvar as que pudessem, colocando pessoas para a vigilância e outras para o resgate. Funcionava, mas muitas crianças morriam ou sofriam sequelas indesejáveis. Um dia, alguém sugeriu que fossem ver por que as crianças caiam na água. Depois das primeiras resistências, formou-se outro grupo para verificar o que estava acontecendo. Descobriram uma quadrilha que fazia isto para intimidar a população e tirar disto proveitos financeiros. Denunciados, os criminosos foram presos.

Não há mais saída para a escola se cada questão for tratada isoladamente. Precisamos de uma nova escola, adequada aos fins que dela se pretendem e às novas realidades que não são difíceis de observar e entender. Claro que o essencial será construir processos coerentes com os referenciais que se estabelecerem. Ainda é tempo para que educadores aumentem e aprofundem as mudanças que estão realizando e, sobretudo, é tempo de o MEC construir um plano de uma nova escola para o crescimento das pessoas; também é tempo para que a sociedade passe a debater fins para a escola e processos condizentes com estes fins.

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