Por sorte, fiquei sabendo antes: o programa “Fantástico”,
da Rede Globo, apresentaria, durante alguns domingos, cenas reais de salas de
aula. Pude ver três episódios e concluir: o programa presta um grande serviço à
escola. Ou não.
Haverá algumas pessoas que enxergam e ouvem. Para elas,
bem-aventuradas as imagens e os sons que mostram o que está acontecendo nas
salas de aula; assustar-se-ão com as estranhas relações entre as pessoas na
escola. Outras, provavelmente a maioria, extremamente apegadas ao que está
estruturado, nada mais enxergarão do que a rebeldia e a má-criação das crianças
e dos adolescentes.
As
primeiras dirão: Como pode uma sociedade suportar professoras “dando” zero para
as crianças? Por que o professor que consegue dar aulas com alguma decência tem
que ser um palhaço? Por que as crianças não demonstram nenhum interesse pelas
aulas? Por que as escolas obrigam as crianças a ficar sentadas e os professores
a falar o tempo todo? Será que crianças precisam estudar disciplinas como se
fossem especializar-se? As outras ficarão pasmas diante do desejo das crianças
de mexer-se continuamente; vão querer que as escolas sejam severas contra esses
futuros prováveis delinquentes; não admitirão outra atitude, para os alunos,
que não fosse ficar quietinho e obedecer; temerão pelo futuro da humanidade.
Para elas, tudo aquilo acentua o desejo de castigar os alunos e impor-lhes
limites.
As primeiras pensarão numa possível reestruturação escolar,
com o estudo de temas que envolvam conhecimentos sobre a natureza e sobre a
sociedade; gostariam de ver a criançada estudando, por exemplo, os planetas, a
água, o mar, as nuvens, os rios, as hortaliças ou a construção de casas, as
eleições, as diferenças entre as pessoas, os países da América, os africanos no
Brasil, tudo isto – e muitas outras matérias, sem estudar alguma disciplina –
sempre com a orientação do professor e com o trabalho dos alunos; ficariam
felizes, esperando ver, na sala de aula, tablets como o IPAD, vídeos, filmes,
revistas jornais; admitiriam grupos de alunos estudando temas diferentes dos de
seus colegas... As outras desejarão mais controle, mais dureza do professor,
completo domínio dos adultos sobre as crianças...
O “Fantástico” não faz julgamentos: apenas fotografa e,
assim, apresenta situações bizarras, completamente irreais entre seres humanos.
Alguns raros expectadores perguntam-se sobre onde foi parar aquele natural
desejo de aprender que todo ser humano demonstra desde o nascimento, aquele
desejo que todas as pesquisas sublinham. A única resposta possível é que foi
sufocado pelo "faz de conta” dos conhecimentos formalizados e das
metodologias inadequadas. É claro que ninguém aprende as batalhas da Guerra do
Paraguai, a distinção entre a vogal e a semivogal, o nome dos rios da Europa, o
mínimo múltiplo comum ou a divisão celular... “conhecimentos” que são
apresentados sem significado; apenas, de má vontade, o aluno memoriza para a
prova. Contrariamente, vi alunos extremamente curiosos, conduzidos por um
projeto por eles mesmo construído, buscando informações sobre os peixes, sobre
o lixo, sobre os mamíferos, sobre o governo da cidade... e debatendo questões
relacionadas a estes temas.
Depois, o Fantástico foi a Portugal para ver a Escola da
Ponte. Será que adiantará mostrar um processo escolar em que as relações entre
as pessoas foram recuperadas e são normais? Será que valeu a pena ver uma escola em que
aprender é uma aventura muito agradável?
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