Tenho dois livros que não são muito conhecidos. Não têm muito tempo de publicação, são bastante irônicos, não tiveram divulgação e, sobretudo, não são como a maioria de meus livros que trazem solução direta para as questões da escola; com estes, as pessoas terão que interpretar e ver, depois, como vão introduzir transformações. São eles: Crônicas para uma nova escola, da WAK Editora (www.wakeditora.com.br) e O que a imprensa não quer saber sobre a escola, da Editora Melo (www.editoramelo.com.br). Os dois são de crônicas que mostram desastres escolares e propõem alternativas. Publico aqui uma do primeiro amostra.
Uma das coisas que logo chamou a atenção de
Volútur foi ver todas estas crianças e todos estes adolescentes, todos os dias
na escola. Tinha vindo da Constelação de Volpi, tomara a forma humana
terrestre, mas não conhecia nossos costumes. Quis logo saber por que este
espetáculo acontecia todos os dias.
__ Ora, Volútur, as crianças vão à escola para aprender as coisas
importantes, para dominar o conhecimento que a humanidade construiu através da
História.
__ E isto é possível?
__ Não é. Mas é preciso tentar... As crianças precisam aprender! Faz
parte da vida.
__ E o que aprendem?
__ Aprendem a hipotenusa, aprendem a regência trina, aprendem o nome dos
rios e das montanhas...
__ E para que serve tudo isto?
__ Mas é clara a serventia, Volútur: para ter cultura, para ser alguém
na vida.
__ Dá mais alguns exemplos...
__ Claro. Aprendem tudo o que é importante: extrair a raiz quadrada,
conjugar os verbos irregulares, definir o coeficiente angular da reta, decorar
a fórmula do pentino-2 e do ciclopenteno, explicar a lei de Faraday...
__ Mas isto não é tema de especialistas?
__ Pode ser que seja, mas as crianças têm que aprender.
__ E todas aprendem?
__ Não. Mas aquelas que não aprendem são reprovadas pelos professores. Aí,
no ano seguinte, repetem tudo outra vez, até aprender. Claro que mesmo assim
nem todas aprendem. Só umas poucas conseguem ir adiante; assim de cada 100
crianças só uma parte conclui o ensino fundamental. Mas quem não conclui, não o
faz por culpa própria.
__ E todas aquelas que terminam, sabem tudo?
__ Não, Volútur, ninguém sabe tudo. Nosso ensino é muito completo e, por
isto, muito difícil: nem os adultos, mesmo aqueles que tenham cursado a universidade,
passariam num exame de todas as disciplinas da 7a série. Mas não complica,
Volútur: as crianças têm que estudar, têm que sofrer; mais tarde, quando
quiserem entrar na universidade, têm que passar no vestibular.
__ Vestibular? O que é isto?
__ É um exame para aqueles que querem entrar na universidade. Neste
exame perguntam aos adolescentes uma porção de coisas dentro das seguintes
matérias: Física, Química, Matemática, Biologia e Português.
__ Só essas? Nada de Economia, Política, Filosofia, Direito, Cidadania,
Psicologia, Saúde, Desenho, Computação, Trânsito, Ecologia, Religião...? Nada
que avalie a consciência crítica, a capacidade de cooperação, a iniciativa, a
autonomia, a capacidade de participação, o altruísmo...?
Nisto chegamos à casa
da vovó e ela ofereceu um chocolate quente a Volútur. Ele ficou encantado com a
bebida e eu não precisei responder.
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