terça-feira, 18 de outubro de 2011

SER PROFESSOR É LEGAL!

           Enviei este artigo para Zero Hora (um dos jornais de Porto Alegre - RS) no domingo, dia 09 do corrente, para uma reflexão no Dia do Professor. Como não foi publicado, apresento-o aqui.                                                           

* * * 

            Muitas vezes, por ocasião de alguma solenidade, aparece a pergunta: “Temos algo para comemorar?” Por exemplo: temos algo a comemorar neste dia dos professores de 2011?

            Professoras e professores constituem uma categoria sobre a qual pesam dúvidas de vários tipos. Há uma convicção de que professores ganham pouco; professoras e professores enfrentam a desconfiança de autoridades e de muitas pessoas da sociedade; quando os resultados escolares são fracos, pensa-se que os professores não têm competência; alguns alunos investem contra professores.

            Na verdade, nada mudou em relação aos professores e às professoras. Como sempre eles e elas são pessoas que vivem sua época e que por ela, nos dias de hoje, estão sendo traídos. O que mudou foi o mundo, em especial ao que se refere aos professores, e esta mudança ainda não foi suficientemente considerada.

            A primeira clareza que é preciso ser divulgada é a de que uma escola – dentro dela os professores – reproduz a sociedade em que ela existe. Até a primeira metade do século vinte, a sociedade tinha uma hierarquia de valores hegemônica e consolidada, algo fundamental no processo educativo. A sociedade realizava o provérbio africano que é a aldeia inteira que educa as crianças. Ao professor cabia reproduzir esta hierarquia em termos de valores, de habilidades e de conhecimentos.

            Como consequência surge a segunda evidência: o professor caracterizava-se por ser alguém. Era privilegiado nas comunidades, não porque fosse rico ou intelectual destacado, mas porque era o representante do que a sociedade considerava importante ser.

            Terceiro: a crise na sociedade – numa transformação extremamente acelerada – abre diferentes hierarquias de valores. Não basta mais, para professores e escolas, ser alguém perfeitamente enquadrado nos valores que a sociedade preza. Isto não existe mais e escolas e professores precisam fazer uma escolha profunda para chegarem a uma hierarquia de valores própria ou derivada do pensamento de algum grupo representativo. Mas isto não é permitido: envolve ideologia e pode representar um perigo para a estabilidade social.

            Por fim, uma quarta mudança envolve professores: todas as crianças e quase a metade dos adolescentes podem entrar na escola. É uma multidão que precisa de comida, de segurança e, sobretudo, pelas condições de suas famílias, dependem, quase inteiramente, da escola para integrar-se na sociedade com saberes diversificados e, consequentemente, com eficácia social.

            Nestas condições – há outras que não cabem aqui – o professor baqueia, perde o chão e entra em crise. Mas é para ele que vão os amores dos alunos, mesmo quando a distância das idades fica muito longínqua. Todas as vezes que ouvimos, depois de vários anos, alunos nossos dizendo que se lembram de nossas aulas e de nossa imagem, podemos dizer: “ser professor é legal!”

2 comentários:

  1. Olá professor Danilo!
    Excelente texto. saudades dos bate-papos de anos atrás.
    Ando muito preocupada com os "discursos" sobre a escola e sobre os professores que aparecem na mídia, nos livros e nas instituições formadoras. Temos cada vez mais responsabilidades a exercer junto à sociedade, mas com as mesmas condições, recursos e instrumentos que já não davam conta antes, muito menos nos dias de hoje.
    As crianças que chegam à escola pública hoje, nem de longe se parecem com o que acreditam os "teóricos" de plantão. Os discursos, na lógica das especializações, não dialogam entre si e são incapazes de enxergar a diversidade e a complexidade que se impõe. Para as Centrais de Vaga, nossas crianças são um número a ser acomodado. Não lotou a sala? Então entra mais um, e mais um! Não tem aluno suficiente para lotar, transfere, encaixa, ajeita, aperta para fechar outra turma. Para os gestores, são aqueles que devem ser "ensinados" para atingirem uma certa nota nos exames nacionais e aumentar a classificação da rede. Para as "instituições formadoras"são as cobaias de estágios e práticas de algumas poucas horas na aplicação de atividades pasteurizadas que desconhecem o "público alvo". Para os pesquisadores, a escola é o locus de confirmação da tese e, para tanto, isolam-se as variáveis para alcançar a máxima científica: "ado, aado, cada um no seu quadrado". Para um certo tipo de militante das causas das minorias, o caminho mais fácil, o atalho para a crítica, esquecendo-se que a escola-lugar e o professor(a)-pessoa não são a mesma coisa que a escola-instituição com suas falhas e deficiências históricas. Ao misturarem as estações, perdem os verdadeiros aliados, aqueles que de dentro da escola, na luta por dignidade e melhores condições de trabalho e convivência, defendem EXATAMENTE a mesma causa.
    Em todas as categorias há profissionais e "profissionais". Com a nossa não é diferente! Mas não há como cobrar eficiência e eficácia sem as condições básicas de trabalho.
    Não há receita de bolo, mas nem um bolo se materializa sem os ingredientes.
    Parabéns e obrigada.
    Soraya Franke

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  2. Olá professor Danilo!
    Excelente texto. saudades dos bate-papos de anos atrás.
    Ando muito preocupada com os "discursos" sobre a escola e sobre os professores que aparecem na mídia, nos livros e nas instituições formadoras. Temos cada vez mais responsabilidades a exercer junto à sociedade, mas com as mesmas condições, recursos e instrumentos que já não davam conta antes, muito menos nos dias de hoje.
    As crianças que chegam à escola pública hoje, nem de longe se parecem com o que acreditam os "teóricos" de plantão. Os discursos, na lógica das especializações, não dialogam entre si e são incapazes de enxergar a diversidade e a complexidade que se impõe. Para as Centrais de Vaga, nossas crianças são um número a ser acomodado. Não lotou a sala? Então entra mais um, e mais um! Não tem aluno suficiente para lotar, transfere, encaixa, ajeita, aperta para fechar outra turma. Para os gestores, são aqueles que devem ser "ensinados" para atingirem uma certa nota nos exames nacionais e aumentar a classificação da rede. Para as "instituições formadoras"são as cobaias de estágios e práticas de algumas poucas horas na aplicação de atividades pasteurizadas que desconhecem o "público alvo". Para os pesquisadores, a escola é o locus de confirmação da tese e, para tanto, isolam-se as variáveis para alcançar a máxima científica: "ado, aado, cada um no seu quadrado". Para um certo tipo de militante das causas das minorias, o caminho mais fácil, o atalho para a crítica, esquecendo-se que a escola-lugar e o professor(a)-pessoa não são a mesma coisa que a escola-instituição com suas falhas e deficiências históricas. Ao misturarem as estações, perdem os verdadeiros aliados, aqueles que de dentro da escola, na luta por dignidade e melhores condições de trabalho e convivência, defendem EXATAMENTE a mesma causa.
    Em todas as categorias há profissionais e "profissionais". Com a nossa não é diferente! Mas não há como cobrar eficiência e eficácia sem as condições básicas de trabalho.
    Não há receita de bolo, mas nem um bolo se materializa sem os ingredientes.
    Parabéns e obrigada.
    Soraya Franke

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